O Blog

No começo eu só queria contar detalhes da minha vida em Toulouse para minha família e amigos curiosos. De repente comecei a ter necessidade de escrever, foi nascendo um diário de crônicas, foram surgindo seguidores, leitores, a vida foi tomando outro curso. Após 1 ano e quatro meses na França, idas e vindas para o Brasil estou diante de mais um ponto de bifurcação, voltando às minhas origens para dar continuação ao blog e a vida. Você está convidado a participar desses próximos capítulos e a se perder e se encontrar nessas novas estradas estrábicas.

sábado, 13 de outubro de 2012

Sobre lápides, pedaços e funerais

E de repente, novamente e inexplicavelmente, você vê mais um pedaço seu, da sua singela e balsáquia história, partir. Por mais que pedaços desses pedaços permaneçam na gente, é difícil não se sentir despedaçado, desolado e desorientado. Que este é o ciclo da vida eu não tenho dúvidas, mas que me  pergunto que horas o bendito ciclo vai dar uma trégua...Isso eu me pergunto.
Já li várias vezes e vi também em filmes, pessoas elocubrando qual a frase colocar na sua lápide, como se ela resumisse a nossa breve passagem na terra. Algumas são marcantes como "hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás"(do Che Guevara) ou ainda “Do pó eu vim, no pó eu vivi, ao pó eu retornarei" (do Maradona), ou "Agora só a terra irá me comer” (da prostituta) e por aí vai, entre o trágico e o cômico, continuo preferindo dar uma boa risada. Digo isso porque agora enfrentando o mesmo ritual funeral que vivenciei nos últimos 3 anos, comecei a participar daquelas decisões e resoluções que ninguém tem cabeça pra fazer nessa hora, tipo conversar sobre o jazigo, o plano funerário, as flores. A mesma indústria que se aproveita da paixão e alegria dos noivos para saquear sua poupança matrimonial, é a indústria que explora sua tristeza, comercializa a sua dor e se aproveita da sua fraqueza  para cobrar 300 reais por uma coroa de flores. Me surpreendi inclusive ao pensar que seria interessante contratar uma cerimonialista para o evento, para oferecer lenços e afins aos encatarrados, dar suporte aos inconsolados que saem sacudindo o caixão, colocar ordem nos discursos, impedir o aparecimento de desconhecidas ex-mulheres e amantes, dando conforto ao defunto que deseja descansar em paz. 
Meu avô era uma pessoa muito inteligente, responsável e intensa. Me inspirei nas 4 faculdades que ele cursou, nos 4 filhos que teve e nos multiplos de 4 cachorros que ele criou. As 4 esposas prefiro não utilizar como inspiração, ainda que tenha estima por todas elas, sobretudo por minha pura e amada vovó, primeira dos 3 a nos deixar em 2010. Sobre o ano de 2011 prefiro não comentar e concluo que meu vô, eterno parceiro do meu paizinho, morreu 70% enterrando seu filho. Os outros 30% foram embora nesse um ano de intervalo que a vida deu pra gente.
Todos esses pedaços que partiram, deixaram pedaços em quem vai sobrando, e como não podia deixar de ser, é nessas horas que eu mais escrevo no blog, é nessas horas que eu descubro algumas verdades...A primeira é que no plano de defuntos do meu pai só cabem 3 presuntos, isso quer dizer que não tem cova pra mais ninguém nos próximos 3 anos (sinal de trégua ou de literalmente não ter onde cair morta). Outro aprendizado é o de fazer tudo que se sente vontade na hora exata em que se sente isso (pensei em ligar pro meu vô na quinta, mas deixei pra falar mais tempo no fim de semana, ele faleceu na sexta)... Agora sóbria, queria registrar que vou tentar não ser extorquida pelos zumbis do cemitério, para não contribuir com a masturbação da tristeza alheia. A história da lápide é a maior balela, na placa do meu pai não cabe nem o nome dele inteiro, quanto mais "sex, love and rock'n roll" que seria perfeito para seu perfil. O que cabe mesmo dizer é que quem ficou, ainda que em pedaços, está vivo, isso é fato, senão também seria enterrado. Então, pelo amor de Deus, a gente tem mesmo é que rezar pela nossa saúde, porque quem está vivo e saudável pode fazer qualquer coisa, qualquer coisa, qualquer coisa, até pensar na frase de sua lápide.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

A tosse carioca



Sinceramente achei que passaria ilesa, ou ao menos não somatizaria aquelas mesmas sensações de exato um ano atrás. Passou rápido, turbulento, confuso e doloroso. E no dia 12 de Julho, completos 365 dias sem o Chicão, posso dizer que foi no mínimo, estranho. Eu vinha me preparando para isso, emocionalmente e espiritualmente, tentando encontrar um equilíbrio que fosse além de um contato de terceiro grau, o que me ajudou, claro, mas não foi o suficiente para eu não reviver aqueles últimos e súbitos momentos com meu pai. Passei o dia inteiro tendo inúmeras lembranças e praticamente nenhum controle sob elas. Coincidência ou não, no dia seguinte, estive a manhã inteira no hospital, com uma crise de tosse alérgica.

Ok, a data cabalística passou e eu estou melhorando. Reconstruindo minha vida aqui no Rio e contribuindo com tijolos para que minha mãe e irmã tenham novamente um alicerce.


A história de que o Rio continua lindo é bem verdadeira, e a cada fim de semana eu descubro mais um motivo para admirar ainda mais a cidade. O que tinha esquecido ou não conhecia bem em relação ao Rio é o caos no trânsito, que me parece pior do que já vivi em São Paulo; o atendimento ruim em 90% dos restaurantes e a banalidade de palavrinhas como "por favor" e "obrigada". Calma, não estou chamando o carioca nem de preguiço ou mal-educado. Sou contra os jargões repetitivos, o que gosto mesmo é de apreciar os choques culturais. Aqui é "normal" você chegar na Casa do Pão de Queijo e a atendente te dizer "Não tem mais pão de queijo e hoje não assamos mais não". Como assim? É normal não ter pão na padaria, chip na loja da Tim, gasolina no posto? Qual minha reação pra isso? Caras e bocas e algumas reclamações de vez em quando, já que mesmo muito paciente e positiva, não sou de ferro. O mais curioso é perceber que em 2 meses, isso passa a ser normal pra você também!



Se por um lado falta no Rio a delicadeza para receber os clientes, por outro sobra hospitalidade das pessoas que venho conhecendo. Não sei se é a veia carioca do nascimento ou se é uma necessidade mágica em se fazer amigos. Em pouco tempo fui abraçada por várias turmas que me ajudam tanto na adaptação à rotina carioca quanto na descoberta de mais uma Mariana. Tem a turma do surf que me tirou às 5h45 da manhã da cama quentinha, me fez ser confundida com as primas pernoitistas da Avenida das Américas e contribuiu para o meu quase afogamento. Tem a turma do Billabong hour, que me faz gastar o VisaVale da semana em apenas uma noite e fomenta a composição de novos funks "in loco". Há ainda a turma dos almoços que deixa o dia mais calórico e alegre. Sem contar a turma do skate, a turma da visita (que povoa minha casinha) e, claro minha turma/dupla amada que vive tudo isso comigo incondicionalmente!



Aí eu percebo que tossir, apesar de muito incômodo é só um detalhe, porque o tempo vai voar, a gente vai engasgar, mas vai sempre ter alguém de alguma turma que vai te abraçar e te mostrar que passar ileso pela vida não dá e no fundo nem deve ter, assim, tanta graça.

sábado, 19 de maio de 2012

Bullying paterno e a chama Olímpica

E nessa nova estrada, nesse louvável e desejado recomeço, peço licença para voltar ao passado e relembrar algumas breves histórias, emergentes em função dos novos caminhos. 
Eu não me lembro bem quando entrei na natação, eu devia ser bebê ainda. Mas não se engane, minha mãe não era daquelas que entra na piscina com seu filho e fica babando por todo e qualquer truque que a criança aprende dentro d'água. Me lembro de nadar numa piscina sem aquecimento no parque de exposições de Valinhos (risos autorizados) e lá fui feliz por muitos anos. No início eu via meu ego perder a noção do tamanho, já que era vista como a bonitinha prodígio na água e eis que chega o momento de ouvir: larga a prancha e muda de raia Mariana! Traduzindo: agora você será da turma do treinamento! Naquela turminha, era o grande ideal dos alunos, ser da seleção! (de Valinhos, interior de São Paulo).
Na minha primeira competição tive várias dores de barriga e nadei "costas". Tive tanto ódio daquela água que subia na batida de todas as pernas na piscina...Eu mal via as bandeirinhas para fazer a bendita virada, faltou pouco, muito pouco para eu chegar em penúltimo. Quase me afoguei! Minha mãe nem deu o ar de sua graça e meu pai, lógico, me sacaneou. Pobre menina, além de praticamente afundar na piscina, ainda é zuada porque ficou em último. Ah! Eu sofri bulliyng paterno! Mas meu professor não, ele era diferente, e eu o admirava muito. Não porque ele era literalmente um moreno alto, bonito e sensual, aos 7 anos eu juro que não sabia o que isso queria dizer. Ele era amável, gentil e se orgulhava da gente. 
Esse foi meu primeiro professor de esporte. Os invernos naquela piscina eram muito duros, as competições intermináveis e eu só uma menina cujas costas não paravam de crescer e pernas não paravam de afinar. Assim, chegou a pré-adolescencia e minha vontade de treinar foi minando e eu migrando para vários esportes: futsal, handebol, basquete, até chegar no jiu jitsu, a merda (sorry) do bulliyng terminou aí. 
Em 1996, assisti e torci incansavelmente durante os Jogos Olímpicos de Atlanta, cantava, me arrepiava e chorava toda vez que ouvia "Reach" da Gloria Estefan, aquelas cenas, aqueles gigantes na piscina, todos aqueles esportes, tantas medalhas, tantos países, tantas vitórias e derrotas juntas, tanta coragem, quanta emoção!

http://www.youtube.com/watch?v=_maDax2z-5k&feature=related

Por mais que tenhamos dúvidas sobre qual a carreira seguir, qual o emprego dos sonhos ou "o que quero ser quando crescer", no fundo, sem clichês, quando o amor por alguma coisa habita a gente, ele desperta uma intuição, uma verdade interior, uma vontade latente, um poder que vai nos guiando, abrindo nosso caminho, enchendo nosso livro de histórias e experiências, que no mínimo valem a pena serem contadas.  Por isso, mesmo me chamando de Forrest Gump, essa é a minha maneira de mostrar esse meu amor pela vida, sejam suas estradas retas ou estrábicas. Tenho claro hoje, que sempre soube dessa minha verdade e vendo Atlanta, já adolescente, isso se confirmou. 

Hoje, começo a integrar um novo time, no projeto dos meus sonhos, na oportunidade de trazer aquela Atlanta de 96, aqui para o meu país quase 20 anos depois, com nossa história, nossa música, nossas piscinas, nosso sorriso, nosso entusiasmo, nosso suor. Assim como meu professor moreno alto, eu me orgulho do meu time, da minha língua, da minha gente... E ainda que o Brasil sofra (como eu) de certo Bullying xenofóbico, acredito, de sincera e boa-fé, que 2016 vai poder inspirar muitos adolescentes indecisos, crianças maduras, adultos céticos e quem sabe até você mesmo, a descobrirem suas estradas, vontades e verdades, a "be stronger and reach higher".

terça-feira, 27 de março de 2012

As tatuagens que Toulouse fez em mim

Fiz uma tatuagem! Sim, uma mudança ou um "adendo-adorno" pra sempre. Porém, antes de falar mais sobre esse evento, queria só expressar a minha aflição em relação aos outros eventos antecedentes e concorrentes a este. Nem me refiro ao bom caráter da empregada que contratei para cuidar das meninas, que deu o ar de sua graça duas vezes e embolsou o dinheiro do transporte, muito menos ao retardado maníaco-religioso que assassinou as crianças na escola de Toulouse (para esse eu não tenho nem palavras). 

Estou falando do congresso internacional em Artes Marciais e Esportes de Combate, que tirou meu sono por algumas semanas, não por eu ser da comissão organizadora, nem por fazer horas a fio de tradução simultânea francês-inglês. Não! A responsável pela minha agonia descontrolada foi a bendita apresentação do trabalho que desenvolvi em Toulouse durante esse 1 ano e 3 meses. Eu que nem descobri o bebê de proveta, a cura do câncer ou um novo aplicativo pro Ipad. Eu só estudo o ensino dos esportes de combate na universidade e para pessoas com deficiência. E assim mesmo, a idéia de fazê-lo em francês estava me engolindo. Mesmo sem ter muitos problemas para falar em público e para muita gente, confesso: estava com dor de barriga antes do congresso. 

Perto de chegar minha hora, recebo um email da assistente social dizendo que a situação mãe-irmã estava um caos (bastante tranquilizador), minutos depois entram na sala os dois professores que analisei no meu trabalho com seus respectivos alunos, recém maiores de idade, para assistir a brasileira, única mulher do evento. Legal pensar que a sala estava cheia, (principalmente para uma leonina como eu), o problema foram os olhares dos professores durante minha reflexão sobre seu jeito de dar aula e, claro, os adolescentes infelizes que nunca viram outro sotaque além do francês toulousain. Entre testas franzidas e risadinhas no fundo da sala, eu me aproveitei do estrabismo para olhar "torto" aos que estivessem tirando minha concentração.
Balanço final: escutei alguns "bravos!" da platéia, passei 6 minutos do tempo permitido e ouvi do meu orientador que eu havia teatralizado a apresentação. Francês é um bichinho difícil de agradar! 
E assim foram as apresentações (teve outra além dessa) e junto com elas o peso das minhas costas!! Tive o privilégio de conhecer pessoas incríveis, rever pessoas queridas,  me aproximar de quem pouco conhecia. Saldo extremamente positivo!
E mesmo tendo que terminar a escrita do trabalho, aproveitei esses últimos dias para curtir intensamente os amigos que fiz aqui, obviamente, o melhor e maior presente de se morar no exterior...Além das lembranças... como a tradução em francês diz: o "souvenir" mais único, pessoal e eterno.
Por isso volto ao tema da tatuagem. Ouvi que se tatuar é coisa de gente imatura, gente louca, gente cool, gente grande, gente boa, gente à toa...sempre quis ter uma, mas nunca tive nada muito profundo ou especial para marcar em mim. Até não poder mais caminhar ao lado do meu pai. Então a vontade veio naturalmente, no intuito de deixar em mim a marca do amor mais lindo que já vivi. 

Por hora, vou fechando meu percurso e minhas aventuras (apenas) em Toulouse, levando na minha mala muito mais do ela pode carregar, mas tudo que cabe e transborda em mim e que desejo levar. Toulouse me tatuou teorias, livros, músicas, comidas, perfumes, pessoas, aprendizados, tombos e superações. 
Obrigada por ter  se arriscado em ler e mergulhar nas minhas aventuras e desventuras, por rir e chorar comigo, por me incentivar, me empurrar, me segurar, me entusiasmar! Sigo tatuada e transformada, pela dor, pelo amor, por este blog, por mim e por você...!

quinta-feira, 1 de março de 2012

Santa fé, santa paciência!


Eu na eminência de retornar a Toulouse para tentar fechar mais um ciclo desta turbulenta vida. Difícil mesmo é não ter a certeza de que as coisas vão acontecer até alguns meros minutos antecedentes a elas. Assim o planejamento, a organização e porque não dizer, a motivação, parecem ir se esgotando e gotejando. Realmente, dois meses estão para Mariana assim como dois anos estão para a Ciclana. Cada capítulo um ou milhões de acontecimentos, cada semana uma ou centenas de reviravoltas, cada mês tantas histórias e tantas dúvidas. 
Início do caminho de Santiago - Espanha/2008
Sem entrar muito no juízo religioso, vou me ater a alguns sentimentos borbulhantes no momento. Sou católica, batizada e catequizada. Não porque meus pais me obrigaram, ou porque eram adeptos e me levaram. Não. Eu pedia à minha avó para ir a missa com ela, para me matricular no catecismo, para me ensinar o credo e a ave-maria. Inclusive, ouvi da minha biza, aos 12 anos que eu tinha vocação para seguir os passos de santa Mariana (uma menina que se tornou freira também nessa idade). Contei para meu saudoso paizinho e logo depois fui matriculada no jiu jitsu. Ok, segui a vida e canalizei minhas vocações e atributos em outras atividades nem tão "puras e canonizadas", mas “de bem”. E sempre "caminhei com fé", valorizando os momentos de alegria e me preparando para os frequentes furacões.   Mas hoje, venho por meio deste, fazer uma confissão, fora da igreja e longe dos padres.

Estou com medo. Medo de perder a fé.

Eu sei que o tempo de Deus (como dizem os que Nele acreditam) é diferente, que quando você acha que não vai aguentar, uma força estranha, vem e deve ser de lá. Também sei que não adianta tentar entender e perguntar "porquê", mas "para quê" e por aí vão os saberes populares, religiosos aos quais a gente se apega, muitas vezes só para ter algo a se apegar. O problema é que nos momentos difíceis todo mundo quer te dizer alguma coisa, na urgência de te ver bem. E aí, muitas dessas pessoas não percebem que economizar palavras nessa hora pode ser muito mais útil e confortante. Só a companhia, o estar ao lado ou segurando no colo, já são mais do que suficientes. Então, por favor, não me venha com esse papo de que Deus não nos dá um fardo maior do que podemos aguentar. Mesmo que seja verdade, ou que você acredite com todas as suas forças, eu te suplico: não me fale mais isso.
Exausta, até as vacas estavam mais dispostas

Como não pedir a Ele explicações sobre o tamanho e o kilos dos benditos fardos? Onde está o manual “Aprenda a lidar com seus fardos em 5 semanas”? Ta bom, que sejam 30 anos, mas a vida inteira para saber O QUÊ fazer com eles não seria demais?
Mais uma confissão: essa semana eu anunciei, Aqui jaz uma pessoa paciente.
Outra confissão: eu amo esses fardos. Amo de verdade e tudo que fiz até hoje foi movida por esse amor.
Uma explicação: na fase atual estou me referindo à minha irmã, que tem síndrome de Rubisntein Taybi, é mais inteligente que eu e a família inteira, está triste e desmotivada a viver. Não quer ir para escola, cuidar da diabetes, se divertir, seguir em frente. Desde que chegamos em Campinas sua razão de acordar para mais um dia é ver a agradável novelinha dos Rebeldes.
Outra explicação: me refiro também à minha mãe que desde a separação do meu pai (há uns 10 anos) desistiu completamente de viver. Suas razões para acordar são a falta de calmante para continuar dormindo. E quando acordada suas maneiras de fazer o dia passar são me ligando 30 vezes por hora, dizendo as mesmas coisas e pedindo tudo que não faz sentido.

Peregrinos amados 

Portanto, essas duas explicações juntas resumem meu dia-dia e minha incansável tentativa de fazê-las querer voltar a vida, cada uma do seu jeito. E eu venho tentando, pedindo ajudas e aceitando também de todos os lados e religiões. Mas essa semana, quando ainda fui bombardeada por advogados me coagindo a confessar, não pecados, mas dívidas que não são minhas, eu pensei...Vou jogar a toalha. E nessa hora, fui lembrada que se eu fizer isso, posso ser judicialmente indiciada por abandono de incapazes. Uau, emocionante, não é mesmo? A justiça é surpreendentemente... “justa”!

Entre uma reza e um choro, um pecado e uma confissão, uma benção e um castigo, eu juro, que temo fraquejar. Mas imploro de joelhos que a fé não me deixe, que a paciência ressuscite ao terceiro dia e que o amor resista ao peso inexplicável das cruzes.



As fotos do íncrivel e longo caminho de Santiago realizado em 2008 ilustram religião, força física e psicológica na companhia de pessoas muito especiais. Qualquer semelhança com o momento atual não deve ser mera coincidência. 

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Uma questão de identidade, amor e endereço


Após uma licença literária forçada, tanto pela vinda repentina ao Brasil, quanto pelas festas e falta de internet, retomo o ano virtual sem muitas resoluções, na tentativa de solucionar as inúmeras pendências que pairam por aqui enquanto eu tentava viver minhas adoráveis aventuras franco-brasileiras em Toulouse.

Gostaria de começar registrando todo meu apreço pelos nômades, ciganos, sem-terra e todos aqueles que não sabem o que responder quando alguém pergunta: onde você mora? Eu já sentia essa confusão de identidade quando me questionavam de onde eu era. Falar que sou brasileira é fácil, mas definir de que estado, já é um pouco mais complicado. Se eu digo que sou carioca, porque nasci no Rio de Janeiro, passei parte de minha infância lá, assim como todas as férias e feriados até a idade adulta, as pessoas (que não são da cidade maravilhosa) acham que sou metida, marrenta e folgada. Se digo que fui criada em Campinas, o povo acha que sou uma patricinha esnobe do interior. No Rio minha família e meus amigos zombam do meu sotaque de paulista, em São Paulo sou marcada pelo resto de sotaque e expressões cariocas que uso. E no fim das contas, na hora de falar da minha origem, eu sempre gaguejo, mas me defino com uma alma e sangue cariocas regidos por costumes paulistas.



Por isso, continuo falando dos conflitos de identidade, endereço, entre alguns outros que guardarei para mim neste momento tentando evitar que você pense que estou numa crise existencial.
É engraçado como algumas pessoas tem prazer em julgar a crise alheia...e como fica bonito um julgamento cheio de chichês e frases de efeito...até comove e arrepia. Assim, fui rotulada de covarde, mimada, irresponsável e sonsa. Por assumir minhas fraquezas e meus medos e por não me culpar ao me achar no direito de perder a cabeça.
Sim, eu estive perdida e confusa, não só em relação à identidade ou endereço...eu me perdi ao não saber mais onde estava o amor. E falo de um amor muito maior que um coração apaixonado, falo de uma força, de uma energia, de um poder “amor” que pode ressignificar a vida e atrair tudo que a gente realmente ama. Por mais que eu constantemente tenha acreditado no amor e o tenha sempre vivido intensamente, eu deixei de perceber como irradiá-lo e como amar o que a vida me propõe.
E assim minha grande resolução para 2012 foi voltar a amar. A minha identidade indefinida, minhas inusitadas mudanças de morada, minhas viagens repentinas, as decisões forçadas, o fardo inexplicado, as perdas “sem” razão, as perdas de cabeça, a rebeldia coerente ou incoerente. Eu decidi voltar a amar aqueles que me julgaram, aqueles que eu machuquei e até aqueles que só me dão trabalho. Pois apesar de gaguejar ao responder de onde sou ou onde moro, o voltar a amar sem questionar, me fez lembrar da minha essência, do meu amor por mim e dos amores que a vida me dá. E o melhor foi concluir que tudo isso já estava em mim e a maneira de preservá-lo é amando cada vez mais todo pedaço da minha jornada, seja ele colorido, cinzento, horripilante ou maravilhoso. Porque são esses pedaços que constroem a gente, a nossa personalidade, a nossa identidade...e o endereço deles não é Rio, São Paulo ou Toulouse...não é nem perto nem longe...é aqui, é aí: DENTRO.